
Artigo de opinião publicado em Conversa Informal, jornal comunitário do Setor Habitacional Vicente Pires, Região Administrativa XXX do Distrito Federal. Ano 19, n. 04/2022, p. 7. disponível em: <https://jornalconversainformal.blogspot.com/2022/04/jornal-conversa-informal-de-abril-2022.html>. Acesso em 18 jun. 2022.
O início do conflito na Ucrânia revelou o horror de toda guerra: mortes, estupros, aumento do número de órfãos, inflação, miséria, refugiados. A disputa imperialista entre OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte) e Rússia parecia não ter como piorar, mas sempre há alguém disposto a quebrar paradigmas e dizer “yes, we can” (sim, nós podemos). Dessa vez capricharam na barbárie. O representante da vergonha foi Arthur do Val, também conhecido por “Mamãe Falei”, deputado estadual por São Paulo e membro do MBL (Movimento Brasil Livre ou Meritocracia Bandida Liberalóide, em tradução também livre).
Usando do pretexto de ir à Ucrânia arrecadar dinheiro para ajudar refugiados, Arthur enviou um áudio via Whats App para um grupo de amigos. A mensagem continha todo o tipo de misoginia, preconceito de classe e, o que não foi falado até o momento: racismo!
Numa das frases, Arthur disse que as ucranianas são fáceis porque são pobres. Ora, o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) do Brasil é 0,765, ficando na 84ª posição mundial. Por outro lado, o IDH da Ucrânia é 0,779 e está 10 posições à frente de nosso país na escala global. Como podemos ver, a Ucrânia não é tão pobre assim. Se Arthur do Val enxergou pobreza nas ucranianas talvez seja porque, sei lá, elas estavam fugindo de uma guerra! Vamos além: o que não falta em São Paulo são mulheres pobres. Então por que o deputado foi fazer turismo sexual no leste europeu?
Falando em turismo sexual, numa das mensagens Arthur falou que o companheiro de jornada para a Ucrânia, Renan Santos, também do MBL, periodicamente faz uma espécie de “Tour de Blonde”, ou seja, uma viagem pelo mundo para ficar com mulheres loiras. Atenção: “Tour de Blonde” (loira) e não “Tour de Black” (preta). Se você pesquisar “MBL” combinado com “África” no Google a única coisa que vai achar é uma crítica do “movimento” a Nelson Mandela, chamando-o de terrorista. O MBL nunca passou nem de avião pela África, que compõe uma das matrizes de formação do povo brasileiro, mas enxergou na Ucrânia, coincidentemente com mulheres brancas refugiadas, um local para fazer sua ajuda humanitária misturada ao desencargo de consciência burguês. E mais: nos áudios, Arthur disse que um dia voltaria para a região com o intuito de fazer o “Tour de Blonde”.
Logo, importa dizer que o que despertou – e desperta – a lascívia de Arthur foi o fato das ucranianas serem brancas, loiras e de olhos claros. Se em São Paulo as mulheres brancas ou negras, ricas ou pobres conhecem Arthur o suficiente para não lhe falar sequer as horas, na Ucrânia o criminoso conseguiu conversar por mais de um minuto com seu objeto de desejo, ainda que interrompido por tiro, porrada e bomba. É óbvio que o deputado é misógino, que viajou com interesse distinto daquele anunciado nos canais do MBL, que houve evasão de divisas com transferência de dinheiro para a Eslováquia, mas há de se apontar também o componente racista envolvido na questão.
O mundo inteiro olha para a Ucrânia e sente pena, mas Arthur sente tesão. Incapaz de se sensibilizar com a situação das refugiadas, entregando filhos a desconhecidos para que sobrevivam ao conflito, talvez a mente empreendedora de Arthur visse na situação que pode gerar uma guerra mundial a possibilidade de criar uma start up para explorar sexualmente as refugiadas, quem sabe uma produtora de conteúdo pornográfico chamada de “Ucranianinhas” ou algo asqueroso típico da quadrilha do MBL. Na África há vários países com IDH menores que o do Brasil e com mulheres mais pobres do que as ucranianas. Porém, nenhuma delas despertou a libido de Arthur. No interior do Amazonas ou de Goiás, Mamãe Falei não é mais do que uma marchinha de carnaval, mas Arthur nunca cogitou ir ao sertão da Bahia numa fila de 200 pessoas para pegar água no caminhão pipa e chamar as mulheres de deusas. Se a mão do mercado é invisível, o racismo de Arthur é explícito.
Arthur e o MBL são representantes da não-política, do esgoto aberto com parte das manifestações de 2013 e que se consumou no golpe de 2016 em Dilma Roussef. Resta à Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) cassar o mandato do deputado e consequentemente seus direitos políticos por 8 anos. Já começou mal por não ter escolhido uma mulher para a relatoria do caso. Arthur tentará defender o mandato com unhas e dentes. O episódio pode ser a pá de cal no túmulo do MBL. Portanto, que o turismo sexual racista de Arhur não tenha o carimbo da Alesp.