
Quase 2 anos de filmagens com mais de 800 vídeos e 500 fotos de servidoras agentes, especialistas e sabe-se lá mais quem que utilizava um dos banheiros femininos da Unidade de Internação de São Sebastião, pertencente ao Sistema Socioeducativo do Distrito Federal. Esses foram os dados levantados preliminarmente pelo portal R7 Brasília sobre o caso do agente socioeducativo Rafael Osvaldo de Carvalho Arantes que instalou uma câmera escondida para filmar mulheres no recinto. Ainda segundo a reportagem, Rafael Arantes teria iniciado as gravações em maio de 2020.
Uma busca rápida no último processo de remanejamento interno da Sejus (Secretaria de Justiça e Cidadania do Distrito Federal) mostra que Arantes começou a trabalhar como agente socioeducativo em 09/12/2019. Isso significa que Arantes arrumou uma forma de rechear sua primeira avaliação de estágio probatório com um PAD em que é acusado de filmar colegas de trabalho mulheres em momentos íntimos e manter, por quase dois anos, a prática criminosa. A lascívia de achar que jamais seria descoberto foi tanta que Arantes permaneceu com a mesma tática sem sequer cogitar que algum dia seria pego.
As informações que circulam nesse 04/02/2022 nos grupos de Whats App dos especialistas socioeducativos e dos próprios agentes são de embrulhar o estômago da frieza machista de Arantes, mas revelam mais que isso. É sabido que o banheiro não fechava a porta corretamente e, mais que isso, volta e meia era utilizado por homens para “lavar as mãos”. Não precisa dizer que as servidoras não lavavam as mãos e tampouco instalaram câmeras no banheiro masculino. Será que o fato de homens frequentarem o banheiro de mulheres é algo comum em outras unidades? Deu até saudade da turma do Escola Sem Partido falando de ideologia de gênero.
Numa sociedade patriarcal que (redundância) privilegia os homens em inúmeras situações, Arantes não se contentou. Talvez pense Arantes que as mulheres são suas, que aqueles corpos lhes pertencem e, como tal, nada há de problemático em filmá-las da forma mais covarde possível. O sujeito era tão canalha que se oferecia para ficar no posto das colegas para que elas tomassem banho, conforme apurou o Metrópoles. Ocorre que Arantes não era alguém que estava de passagem pelo prédio, pediu pra usar o banheiro e instalou a câmera escondida. Arantes é um agente de Estado e seu ato é uma violência institucional, tendo que ser respondida não de forma individualizada e sim pelo Governo do Distrito Federal. A única ação do GDF até momento foi a publicação da Portaria nº 136 de 03/02/2022, publicada na página 43 do DODF nº 25 de 04/02/2022 designando Comissão de Processo Disciplinar para apurar os fatos (Processo SEI nº 00400-00007316/2022-40).
Da vista do ponto do direito administrativo o governo agiu certo, mas ainda falta a resposta política para o ato de machismo institucional. Erick Filippelli, chefe da pasta da Secretaria da Mulher, publicou em seu instagram (@erickafilippelli_) às 14h00 de hoje que “empoderamento é ter poder de escolha”, sem mencionar nada do acontecido. Pois bem secretária, as servidoras do socioeducativo não tiveram muito poder de escolha ao serem filmadas por quase 2 anos por um servidor. Marcela Passamani, chefe da Secretaria de Justiça e Cidadania, a qual está vinculado o socioeducativo do DF, também não se pronunciou*. O site do jornal Metrópoles cita uma resposta da Sejus, mas que até o momento (16h22) não é pública e deve ter sido dirigida somente ao veículo de comunicação.
Por parte das entidades representativas, o Sindsse (Sindicato dos Servidores do Socioeducativo), com agenda sempre lotada mas que no natal, com o devido “espírito cristão”, posta mensagem de boas festas com árvore de natal feita de armas de fogo, não falou uma vírgula em seu site ou redes sociais. Sororidade mesmo somente por parte da AESS (Associação dos Especialistas do Socioeducativo) que fez uma nota chamando a atenção do caso, marcando posição contra o machismo e se solidarizando com as servidoras diante da atitude bárbara pela qual passaram.
Parabéns AESS! Bola fora do Sindsse, Sejus e Semulher.
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NOTA DE SOLIDARIEDADE ÀS AGENTES FEMININAS DO SISTEMA SOCIOEDUCATIVO DO DF
A Associação de Especialistas Socioeducativos – AESS DF, vem a público manifestar sua solidariedade às colegas agentes socioeducativos que mais uma vez sofrem com a cultura da violência contra a mulher e o machismo no ambiente de trabalho.
Repudiamos a atitude criminosa do servidor que instalou câmera em banheiro de uso feminino em uma das Unidades de Internação do Sistema Socioeducativo. É necessária a devida apuração do caso, punição ao violador e reparação às mulheres agredidas.
Nós mulheres, que também somos a maioria no grupo de especialistas socioeducativos, vivemos cotidianamente práticas violentas, agressivas, machistas e preconceituosas em nosso ambiente de trabalho. Temos nossas competências e profissionalismos questionados e agredidos por nossa condição de gênero e isso precisa parar. As mulheres trabalhadoras do sistema socioeducativo merecem respeito e devem ter garantida sua integridade física e psicológica nos espaços laborais.
Violar a intimidade de uma mulher e ainda compartilhar imagens e vídeos de seu corpo pelas redes sociais é uma agressão! Exigimos a punição deste agressor e uma política organizacional que se comprometa com o combate à violência contra mulher, criando e fortalecendo mecanismos, instrumentos e canais de comunicação institucionais que promovam a equidade de gênero e a segurança da mulher em seu ambiente de trabalho.
Agentes femininas do Sistema Socioeducativo do DF, vocês não estão sozinhas neste momento de dor e indignação! A AESS DF reitera sua sororidade a todas as mulheres da socioeducação e se disponibiliza a ajudar no que for preciso.
Atenciosamente,
Luana Regina Euzébia da Silva
Presidente da AESS-DF
(Gestão 2020-2022)
—————————————————————————————————————————–* Atualização Às 17h30 de 04/02/2022 – Segue ótima nota da Subsecretaria do Sistema Socioeducativo, vinculada à Sejus.